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Segunda, 6 de outubro de 2003, 08h16 
"Escrever novelas é brincar de Deus", diz Maneco
 
Roberta Brasil
 
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Manoel Carlos compara o trabalho de escrever Mulheres Apaixonadas ao de pilotar um boeing. "É difícil de decolar, fácil de conduzir nas alturas e um 'Deus-nos-acuda' para pousar!", assume, aos risos. Não é para menos. Na tripulação, foram mais de 100 personagens; a bordo, nada menos que 50 milhões de telespectadores embalados todas as noites pelas tramas realistas do autor. E não faltaram polêmicas. Da bala perdida no Leblon ao jovem casal de lésbicas, da esposa obsessivamente ciumenta à neta sem escrúpulos e o marido espancador.

Bastaria um deslize para Manoel enfrentar turbulências pelo caminho. Mas o veterano piloto só fez o boeing subir mais e mais no ibope. Após 203 capítulos, a novela "aterriza" nesta sexta com a excelente média de 52 pontos de audiência. "Às vezes, eu penso que a pista é curta", suspira o autor, em tom confessional.

Mulheres Apaixonadas pode ser a última novela de Manoel Carlos. Aos 70 anos - 52 deles dedicados à televisão, ele quer descansar e ter mais tempo para a família. "Este ano, por exemplo, eu não pude curtir meu filho de 11 anos. Para um homem da minha idade, é um preço alto demais", lamenta. Quando escreve uma novela, o autor acorda às 5h30 e chega a passar 14 horas diante do computador. Mas trabalha sempre com a porta do escritório aberta. "É o jeito que encontrei de participar da rotina da casa", explica.

Manoel Carlos começou a carreira em 1951, como ator na TV Tupi, e passou por quase todas as funções dentro de uma emissora de tevê. Como autor de novelas, consagrou-se por criar tipos femininos marcantes. "Nem podia ser diferente... As mulheres estão no centro do mundo!", enaltece. Manoel também é dono de uma maneira peculiar de medir a popularidade de suas histórias. Ouve sempre a opinião de alguns "palpiteiros cativos" - na padaria, na farmácia, na banca de jornal... - do Leblon, bairro onde mora na Zona Sul do Rio. "Mas faço o que bem entendo com meus personagens. Escrever novelas é brincar de Deus", compara, sem cerimônia.

Mulheres Apaixonadas chega ao fim com 52 pontos de audiência. Superou suas expectativas?
Sem dúvida. Quando escrevi a sinopse, me assustei porque tinha boas histórias, mas eram muitas para uma novela só. Então, disse para a Marluce (Dias da Silva): "Marluce, minha novela é um boeing: muito difícil de levantar vôo. Aí entra numa velocidade cruzeiro. Mas, para pousar, é um problema!". Ela morreu de rir!

Mas a novela passou por várias mudanças desde a sinopse...
Uma novela não existe antes de estar no ar e antes de acabar. Na sinopse, a gente planeja coisas que, em grande parte, não acontecem. E eu mudei de plano tantas vezes nessa novela... A Laura e a Marcinha eram para ser vilãs, deixaram de ser... A Fernanda era para morrer logo, viveu três meses mais... Diariamente, eu me pergunto o que vou escrever. Juro que não sei! Por isso, deixei de entregar sinopse aos meus atores. Assim, não crio expectativas. Lembro-me que, quando um ator perguntava ao (falecido diretor) Paulo Ubiratan pela sinopse, ele dizia: "Que sinopse? A vida não tem sinopse!".

Você não escreve os capítulos com antecedência. Isso não causa problemas?
Sempre causa. Mas, no meu caso, todos já entram na novela sabendo disso. Tenho de ver o resultado no ar para escrever os capítulos seguintes. E também sou o rei do adendo. Entrego o capítulo e logo depois mando dois, três adendos! Outro dia, o pessoal já estava até gravando. Tiveram de regravar... Eu vou mudando e, se pudesse, mudava até no ar. Há autores que terminam a novela um mês antes e viajam. É o método deles... Mas não o meu!

E como trabalham seus colaboradores?
Encomendo algumas cenas que sei que vou usar algum dia, mas é pouca coisa. O problema é que a minha novela é muito autoral e eles não sabem o que eu quero... Quando chega nos últimos 50 capítulos, então, escrevo realmente sozinho porque meus colaboradores não sabem que finais pretendo dar. Na verdade, nem eu mesmo sei!

Violência doméstica, alcoolismo, bala perdida... Houve algum momento em que pensou ter se excedido?
Até agora, não. Todas as histórias polêmicas estão amparadas em pesquisa. A única que pode parecer excessiva é a do Marcos. Depois de uma cena em que ele espanca a mulher, houve quem reclamasse que a empregada não chamou a polícia. Mas nossa pesquisa mostra que até pai e mãe não fazem nada. Ficam galvanizados, hipnotizados com a violência.

Você abordou alguns "tabus", como o das meninas homossexuais... Até onde pretende ir com eles?
No caso das meninas, sempre estive tranqüilo porque sabia exatamente como conduzir as coisas. Conquistei o público devagar e, principalmente, não caricaturei. Agora, a história do beijo - que estaria proibido porque teria sido rejeitado numa pesquisa - é muito engraçada. Nunca houve pesquisa nenhuma sobre isso! Foi uma telespectadora que, entrevistada numa rádio, falou algo do tipo: "Acho lindas as meninas. O amor não ofende... Agora, também não vamos ter beijo na boca, não é?". Então, se vai ter ou não o beijo, sou eu que decido! A Globo não censura meu trabalho. O autor da novela das oito é o cara que tem a chave do cofre da empresa. Então, eles têm de confiar em mim. Não vou mostrar nada que as pessoas não queiram ver!

Mas você concorda que esta foi a sua novela mais ousada...
Claro! Sei que, nas cenas de violência, tem gente que desliga a tevê. No outro dia, a minha irmã mesmo me disse que a cena estava forte e ela desligou. Tudo bem... E a minha irmã me adora e adora a novela! Mas desligou, deu um tempinho e ligou outra vez.

Personagens como a Heloísa e o Marcos tomaram um rumo tal que ficou difícil regenerá-los...
O certo para o Marcos seria passar dez anos na cadeia. Mas não existe essa possibilidade pelas leis brasileiras. Então, como é que eu poderia deixar esse homem livre? Cumprindo pena com trabalho comunitário? Atravessando criança na porta da escola? Tenho de matá-lo! Mas só estou matando porque a Justiça não existe para o caso dele. Já a situação da Heloísa eu ainda não resolvi. Só sei que ela precisa de tratamento psiquiátrico porque já virou uma assassina em potencial.

Suas tramas costumam incluir campanhas sociais. Acha que a novela tem por obrigação prestar este serviço?
Se a novela não for algo mais do que apenas entretenimento, ela não cumpre o seu dever. A novela no Brasil atinge, diariamente, 50, 60 milhões de pessoas! É preciso levantar assuntos polêmicos. Provocar a discussão no dia seguinte, no banco, na escola, na rua, no açougue, na padaria... Desta vez, toquei em assuntos que mobilizaram muita gente. A passeata pelo desarmamento, por exemplo... Eu inventei a passeata porque vi que estava na moda. Abria o jornal e via a Xuxa toda de branco numa passeata pela Paz. Então, pensei: "Quando a Fernanda morrer eu também vou fazer uma passeata!". Era uma passeatazinha... Mas a coisa foi crescendo e virou uma manifestação de verdade. Então, enfiei os meus atores lá. De todas as minhas novelas, esta foi a que ficção e realidade se misturaram com maior eloqüência.

E qual é a sensação de chegar ao fim?
É fantástico, porque novela é uma estiva muito grande. E eu não sou mais uma criança... Às vezes, fico quase 24 horas no ar! Com esse ritmo, perco momentos valiosos para um homem da minha idade. Este ano, por exemplo, não pude aproveitar meu filho caçula. Eu tenho 70 anos e ele, 11... Quantos anos mais terei com ele? Então, quando termina uma novela dessas, tenho vontade de retomar hábitos absolutamente simples, como ver um filme com o Pedro, dar uma volta na quadra, essas coisas. Por isso, não pretendo voltar a escrever novela.

Então Mulheres Apaixonadas é a última? Você disse o mesmo em Laços de Família...
Eu tenho um contrato com a Globo até 2008. Posso escrever minissérie, especial... Qualquer coisa. Só não gostaria de escrever mais novela e já comuniquei isso oficialmente à emissora. Eles argumentam... Mas como tenho um ano de férias, não vou discutir isso agora. Evidentemente, não posso jurar que não vou fazer outra, mas posso jurar que não quero fazer.

E você já faz planos para depois das férias?
Claro! Quero adaptar um romance do Mário Donato chamado Domingo com Cristina e um outro romance que é um grande sucesso em Portugal. Trocaria fazer novela por duas minisséries por ano, ou então uma minissérie de até 50 capítulos. Também gostaria de escrever um seriado. Fiz A Família Trappo durante muitos anos e acho A Grande Família o melhor programa da televisão brasileira atualmente. Tenho muitas outras possibilidades... Não preciso ficar fazendo só novela.

Telespectador privilegiado
Todas as noites, o mesmo ritual se repete. O autor de Mulheres Apaixonadas troca o computador, no qual trabalha por mais de 12 horas diárias, por televisores instalados em vários cômodos da casa. Assim, fica certo de que não perde o capítulo da novela. Logo na primeira cena, Manoel Carlos vibra com a eloqüente atuação de Dan Stulbach. O enfurecido Marcos dá raquetadas nos utensílios do quarto. Manoel assiste a tudo de pé - é a sua maneira de descansar das sucessivas horas passadas sentado - e não desgruda os olhos da enorme tela. "Bem que o Ricardo (Waddington, diretor) me disse que ele quebrou o cenário todo! Era para quebrar um porta-retratos... Mas ele se empolgou!", conta, aos risos, durante o intervalo.

De fato, Manoel é o maior entusiasta do próprio elenco. Não poupa elogios à maioria. Comenta a beleza das jovens atrizes, o talento dos veteranos e o perfil psicológico dos personagens... Às vezes, parece um simples telespectador. Na verdade, é mesmo com olhos de telespectador que ele assiste à própria novela. Só assim, garante, consegue escrever. "Se pudesse, só escreveria um capítulo depois de ver o anterior. Preciso sentir a pulsação da história", afirma o autor.

Mas a tal "pulsação", Manoel também encontra na conversa com velhos conhecidos do Leblon - bairro onde morra, na Zona Sul do Rio, e onde quase sempre ambienta suas tramas. Outra conselheira é Bete, sua esposa. No salão de beleza que ela freqüenta, por exemplo, as manicures não querem que a Rosinha, personagem de Guilhermina Guinle, fique com o marido taxista. "Elas acham a Rosinha chata! Querem o motorista só com a patroa e a empregada!", conta Bete. Manoel ouve silenciosamente. Mais tarde, mostra-se simpático à idéia. "As manicures da Bete vão ficar satisfeitas", arremata.
 

TV Press
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